As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Poluição na Orla de Macapá (Parte 2) - Jornal Folha do Amapá / 2002

"Barquinho" - Desenho de Eva Clarisse
Mais uma artista colaboradora a serviço da Educação Ambiental
Na semana do Dia Mundial da Água (22/03) muitas ações de conscientização são desenvolvidas para a preservação e uso racional dos recursos hídricos. É de praxe as atividades nas escolas, universidades, praças, ruas, etc. As entidades governamentais relacionadas ao meio ambiente estão, geralmente, à frente encabeçando algum projeto. Em Macapá tivemos o "Olha a Orla", idealizado pela SEMA, que objetivou chamar a atenção da sociedade para a limpeza de nossa orla. Que bom seria se todos compartilhassem deste mesmo olhar de responsabilidade com o meio ambiente e tivessem mais atitudes de educação ambiental.  Aqui, às margens do maior rio do mundo, nesta terra das águas amazônidas - cobiça do mundo - é impressinonate e triste ver o descaso de muitos com a preservação de nossos rios. A orla de Macapá, mesmo sendo limpa por uns, acaba retornando à condição de lixeira para outros. Isso é um costume arraigado profundamente em muitos, que deve e precisa ser mudado. Acredito que a simples observância de ações solidárias ao princípio "lixo no lugar certo" já seria suficiente para manter em boas condições a saúde ambiental de nossa orla. Sem também esquecer que, sem a ação efetiva da prefeitura em disponibilizar lixeiras e recolher o lixo, muita coisa terá sido, praticamente, em vão. O mesmo se aplica a continuidade de ações de conscientização em todos os setores da sociedade e, principalmente, às ações de todos nós (os agentes das mudanças).

Na visão idealizada por uma criança, 
um rio de águas límpidas... remanso de tranquilidade e beleza natural. 
Realidade futura?
(Desenho de Eva Clarisse)
No presente... uma natureza sedimentar, 
potencializada pelas ações despreocupadas de quem usa o rio como lixeira... 
insensíveis ao compromisso de responsabilidade ambiental, 
aqui na orla de Macapá. 
(Fotos: Arquivo SEMA-AP)

Vasculhando os arquivos da Biblioteca Ambiental da SEMA-AP encontrei esta velha reportagem de um jornal de 2002 (Folha do Amapá). Texto "velho" na data, mas "atual" no assunto tratado. Realidade que se mantem até hoje. O texto é de Rita de Cássia e fotos de Val Fernandes.

Orla de Macapá prejudicada pela ação da natureza

Paisagem da frente da cidade está sendo modificada pelo assoreamento, 
originando uma nova visão das margens do Amazonas

A "Folha" vem mostrando em várias edições casos de assoreamento que estão ocorrendo em todo o Estado do Amapá. É o caso da Região dos Lagos e do Pacuí, onde o baixo nível da água está causando prejuízos ao meio ambiente, dificultando a pesca e abrindo valas que transportam terra aos lagos e rios. No caso específico da Região dos Lagos, os búfalos estão abrindo canais entre os lagos e a água salgada do Oceano Atlântico. Agora, a bola da vez, ou melhor, a local da vez é a orla de Macapá, mais precisamente a área que compreende os bairros Santa Inês, Perpétuo Socorro até o Canal do Jandiá. São quilômetros de paisagem que aos poucos perdem as suas características naturais, dando origem a uma nova visão das margens do Rio Amazonas.
Francisco Oliveira e pescador, tem 39 anos, navega há sete e lembra como era a paisagem da cidade. "Dava para ver todas as luzes da cidade quando a gente vinha aportando na frente dela. Agora o mato cobre quase tudo, ficou estranho".  
O  Rio Amaazonas em determinado ponto de sua extensão fica localizado numa região considerada a mais vasta área de terras baixas do Brasil, chamada Planície Amazônica, entre o Planalto das Guianas, ao Norte (norte do Amapá-Oiapoque) e o Planalto Central, ao SuI. Todos os sediimentos (terra, argila, madeira, cipós, árvores, cascas, vegetais, etc) provenientes desses terrenos altos deságuam no Rio Amazonas.
Barco aguarda 
a maré  encher
 para atracar
"A cidade de Macapá está inserida nas terras baixas. Por isso, ela é uma área típica de deposição desses sedimentos. Esses detritos são carregados desde as cabeceiras do Rio Amazonas, na Cordilheira dos Andes, onde recebe o nome de Maraño, até a sua foz, no Oceano Atlântico", explica a geógrafa Rosana de Farias, professora da Universidade Federal do Amapá.
Em Macapá, esses sedimentos estão se depositando na orla da cidade, gerando verdadeiros entulhos nas margens do rio. São árvores, plantas, toras de madeira, cascas e principalmente terra. No caso de Macapá, por haver uma barreira de concreto, esses sedimentos acabam sendo depositados, jogados nas margens. Diferente de aproximadamente cinco anos atrás, quando a visao da frente da cidade podia ser apreciada sem o impedimento de vegeetação alguma, hoje pode-se notar a presença de verdadeiras "florestas" criadas ao longo do percurso Santa Inês-Canal do Jandiá. São metros e metros de mata que fecha, em alguns pontos, totalmente a visão da praia. 
No Igarapé das Mulheres é possível perceber a dimensão do assoreamento, hoje tem entre 5m e 6m.
Poluição visual

Em alguns pontos é possível verificar o empilhamento de toras de madeira, que dão ao lugar urn aspecto de lixeira. Esse fenômeno pode ter sido causado exclusivamente pelo curso normal da natureza.
A nova paisagem não agrada a muitos moradores da orla. Alguns cogitam a hipótese de que o govemo, juntamente com a prefeitura e os orgãos responsáveis pelo meio ambiente, façam uma, digamos, capinação das margens. Porém, eles não levam em consideração, ou talvez não tenham conhecimento de que essas alterações do meio ambiente são um processo natural, ao qual não é permitido o impedimento pelo homem, pois junto com elas são atraídos espécies animais e a formação de uma nova cadeia alimentar.
O acúmulo de sedimentos vem transformando a frente da cidade. A paisagem não agrada moradores da orla, que sugerem a capinação da margem.
 Um caso à parte

Quem vai ao Igarapé das Mulheres pode perceber que lá, além da ação da mãe natureza, o homem tem contribuído, e muito, com o assoreamento do local. É comum encontrar (quando a maré está seca), no leito do rio, bagaços de cana-de-açúcar, madeira e todo o lixo que os ambulantes e moradores jogam no local. Ou seja, a área está aos poucos virando uma lixeira pública. O local onde os barcos atracam está aterranndo aos poucos. Nota-se visivelmente a diferença. Antes o ramal tinha aproximadamente nove metros de profundidade, hoje não passa de cinco ou seis metros. 
MONTAGEM DE ALEXANDRE SOBRE FOTO DE VAL FERNANDES
Por estar inserida nas terras baixas, Macapá é uma área típica de depósito de sedimentos formados por terra, argila, madeira, vegetais, cascas,etc.

 Problemas econômicos

No caso do Jandiá, o assoreamento está causando o estreitamento do canal e a dirninuição do nível da água. Isto beneficia apenas a passagem de catraias, embarcações pequenas e prejudica outras. Segundo informações de moradores, a Prefeitura e a Secretaria Estadual de Transportes executaram várias escavações no lugar. Dizem ainda que antes as embarcações podiam entrar no canal mesmo com a maré vazante, agora, é preciso deixar a maré encher para ter acesso ao canal.
Rosana de Farias explica que "o assoreamento pode inclusive gerar urn problema econômico. Porque é por alí, pela entrada do Canal do Jandiá, no Igarapé das Mulheres, no Santa Inês, que são escoados vários produtos como frutas, verduras, pescados. Esses locais, com pouca profundidade, permitem a entrada apenas de barcos de pequeno porte".

Aprendendo com a prática

Antonio Rodrigues, 46 anos, é um entre os muitos pescadores que atracam sua embarcações no canal do Igarapé das Mulheres. Proveniente do município de Chaves, no Pará, há vinte anos vem a Macapá para vender peixes, frutas e farinha, e levar daqui mercadoria para sua família. Mesmo com pouca instrução, ele demonstra conhecer a problemática do Rio Amazonas. A bordo de seu barco denominado Nativa, ele faz seu relato:
"As praias empurram toda essa terra para cá (Igarapé das Mulheres), tem muita maresia, muita correnteza, aí vai aterrando essa área onde os barcos ficam. O lixo que jogam aqui ajuda tambem a aterrar o lugar, são atravessadores, o pessoal do bairro, todo mundo joga lixo. Aí a água vai diminuindo o nível, a terra vai crescendo. A água ainda cresce, mas não é como antes. Isso aqui era fundo, não tinha muito lixo. Eu acho que isso ja aterrou mais dois metros. Antes, na maré seca, a gente podia entrar aqui sem nenhum problema, a água não falhava. Hoje tem que se esperar a maré encher, a gente fica lá fora na praia, esperando encher para poder sair e chegar aqui pela preamar. Todo o ano sai a escavação aqui. Eles cavam uns quatro a cinco metros, mas não dura muito tempo. Dentro de três a quatro meses, volta tudo como antes".
CURIOSIDADES

• O assoreamento leva à formação de vegetação típica de áreas alagadas e de grande porte, é o que se pode verificar por toda a orla da frente da cidade. 

• As águas do Rio Amazonas são denominadas de águas brancas, mas na realidade são águas de cor amarelada, como o Huang-hu, na China. Isso ocorre devido aos sedimentos típicos do Rio Amazonas, que carrega grande quantidade de argila. 

• A Bacia Amazônica é tambem chamada de Bacia Sedimentar, devido a grande quantidade de sedimentos que são depositados ao longo do rio.

• As margens são áreas de deposição desses sedimentos.
Fonte:  Jornal Folha do Amapá - 26/01 a 01/02 de 2002
O texto foi pesquisado nos arquivos da

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