As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Trapiche - Ancoradouro de Sonhos (Vários Autores)

"É surpreendente a influência que o velho trapiche, da frente de Macapá, tem na alma das pessoas. Gente que cresceu com ele, gente que o conhece a pouco tempo, gente que passa por lá de vez em quando. De alguma forma, o aspecto do velho estirão de madeira se funde com os anseios de liberdade, com as lembranças que vêm e vão ao sabor da maré, com o imaginário barquinho de papel que leva os sonhos para onde eles quiserem ir. Sempre há algo a deixar ou buscar no velho trapiche.
Em nove crônicas, lindamente ilustradas, esse livro exibe um envolvente perfil do trapiche e dos sonhos ali ancorados. Algumas crônicas são pura e deliciosa ficção. Outras, são relatos poéticos da cidade que aprendeu a crescer, sem abandonar sua história. Um trabalho que marca o resgate de um dos principais ícones da cultura e da história da cidade de Macapá, o Trapiche Eliezer Levy."
MÁRCIA CORRÊA (Organizadora do livro)
 

Informações do livro:   
Título: Trapiche - Ancoradouro de Sonhos
Autores: Vários
Organização: Márcia Corrêa
Ilustrações: Luis Porto, Manoel Bispo, Da Gama, Ernandes Melo e Karla Gomes
Editora: GEA
Ano: 1998
Páginas: 66
Tema: Crônicas / Amapá

Sumário:
- Sob o céu, no trapiche (Luli Rojanski)
- Memórias do trapiche (Elson Martins)
- Grilhões Imaginários (Márcia Corrêa)
- O velho e o trapiche (Carlos Bezerra)
- Gostosas trapichadas (Hélio Pennafort)
- O homem curvo (Fernando Canto) 
- Um corpo no ar (Corrêa Neto)
- Clarões da alma (Capiberibe)
- Meninas das ilhas (Vássia Vanessa da Silveira)

O Trapiche Eliezer Levy está entre os principais pontos turísticos na orla de Macapá. Essa obra o homenageia com crônicas escritas por ocasião de uma de suas mais importantes reformas, nos anos noventa, que o modernizou e trouxe nova perspectiva para o turismo.
A publicação teve tiragem modesta e simples em seu layout, contando com nove textos de escritores locais, também ilustrados por artistas da terra, organizados por Márcia Corrêa. Alguns são nostálgicos, com um saudosismo de outros tempos, quando o trapiche tinha uma conotação de ponto de entrada da cidade e maior movimentação (nesse aspecto podemos citar os textos de Hélio Pennafort e Capiberibe). Outros são introspectivos, com uma reflexão sobre as efemeridades da vida, claro, tendo como testemunha o velho trapiche (Luli Rojanski, Corrêa Neto, Carlos Bezerra e Fernando Canto tem esse ponto em comum em suas crônicas). Vemos também o velho estirão de madeira ou centopeia do rio (gostei desses termos!) associado a boemia da juventude de outra geração (texto de Elson Martins), com um romantismo poético sobre a emancipação de uma ribeirinha (crônica de Vássia Silveira) e em um devaneio com conotação religiosa evocada pela pedra e imagem de São José (no texto de Márcia Corrêa).
Pena que esse trapiche não tem recebido a atenção e cuidados que merece e a poesia muitas vezes acaba ficando só na literatura.

MENINA DAS ILHAS

Ilustração de DA GAMA, para
a crônica de Vássia Silveira
Vazante
Uma dor aguda apertava-lhe o peito, mas remava. O balanço e a escuridão das águas faziam-na revolver lembranças da infância na roça, os banhos de rio, o peixe que levava para garantir a comida do dia.
Pensava o quanto tinha sido feliz no pedaço de chão da família. Nele, tinha aprendido a apanhar açaí, nadar, andar pelos matos sem sentir medo ou se perder.
Viu os meninos puxando-lhe a barra do vestido de xita, a mãe gritando para ir logo apanhar a farinha da comadre, o pai jogando na cesta os tamuatás fresquinhos.
Pareceu-lhe, de repente, que a fuga tinha sido obra de encantamento de boto. Sentiu um gosto salgado molhando-lhe a face.
Cheia
Naquela noite, Ciã apertou-se num abraço longo à mãe. Beijou os irmãos mais novos. Pediu a benção ao pai.
A velha, cansada dos anos que pesavam-lhe as costas, estranhou a afetividade da menina.
A desconfiança, no entanto, não lhe fez imaginar que, dali em diante, não teria mais a filha consigo.
Movida pela vontade de conhecer o outro lado, deixou a casa dos pais antes do dia amanhecer.
Pororoca
Sentiu a força da criança que trazia no ventre e lembrou a emoção de menina ao ver, estendido sobre as águas, o madeiral do trapiche. Lágrimas pesadas molharam novamente o rosto enegrecido pelo sol.
Na época, Ciã não sabia nada da cidade. Tinha chegado às proximidades do Eliezer Levy, que lhe parecia uma cobra grande boiando nas águas do Amazonas, sem imaginar a vida dura que levaria nos próximos anos.
(Início da crônica Menina das ilhas, de VÁSSIA VANESSA DA SILVEIRA)


O trapiche foi construído em 1938, em Macapá, pelo então prefeito Moisés Eliezer Levy, com verbas oriundas do Governo do Estado do Pará e por ordem do  interventor do Pará, Magalhães Barata.
A obra, antes de ser construída foi submetida à Marinha Brasileira, que a inviabilizou em razão da frente de Macapá ser bastante rasa para atracadouro de embarcações que, no período da maré baixa, tinham que ficar a mais de mil metros de distância da orla de Macapá.
Desrespeitando a orientação da Marinha Brasileira, o interventor resolveu autorizar a construção do trapiche, que ficou construído em madeira até 1998, quando sua estrutura foi substituída por concreto, com a disposição de um bondinho para transportar turistas do inicio até o fim, onde tem uma estrutura de restaurante.
Com a transformação de porto para um complexo turístico, as embarcações que antes paravam no trapiche passaram a desembarcar em rampas situadas na orla do Santa Inês.
Situa-se em Macapá, na Avenida Beira-Rio, em frente ao  Macapá Hotel. 
(Texto de EDGAR RODRIGUES - Historiador)

A obra está disponível para consultas na
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 
 
Macapá - Bairro Central


Veja também:

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Quilombolas: reivindicações e judicialização dos conflitos (Vários Autores)

Este terceiro número do Vol. 01 “Caderno de Debates Nova Cartografia Social”, ora apresentado, contém trabalhos discutidos durante a III REA - XII ABANNE, realizada em Boa Vista (RR), na Universidade Federal de Roraima, entre 14 e 17 de agosto de 2011.
Os conflitos sociais que envolvem as comunidades quilombolas são apresentados como inevitáveis, sob a argumentação de que a política, a justiça e as decisões econômicas prevalecentes e “racionais” não estariam no campo da escolha destes agentes sociais. As novas diretrizes econômicas, definidas como “desenvolvimentistas” ou de “protecionismo” e defesa comercial, expressam decisões de curto prazo e de caráter emergencial. A dominação política legitima-se no conflito, assim como opera com base na violência física e simbólica.
Os trabalhos desta coletânea situam-se, portanto, no campo da pesquisa antropológica, focalizando debates em torno do ativismo judicial e das implicações da judicialização da política nas práticas dos antropólogos e contribuindo para que possam emergir novas possibilidades de ações, visando restituir direitos e conduzir a uma análise crítica da violência nos conflitos sociais e das formas de mobilização étnica para combatê-la. (Sinopse na obra)

Informações do livro:  
Título: Quilombolas : reivindicações e judicialização dos conflitos (Cadernos de debates Nova Cartografia Social)
Autores: Vários
Editora: UEA Edições
Ano: 2012
Páginas: 172
Tema: Conflitos Socais / Quilombolas
Não sou leitor rotineiro de literatura acadêmica. Apesar das dificuldades que tenho com o formalismo, não as descarto de minhas buscas. E ainda bem, pois essa publicação foi uma das leituras mais interessantes que fiz esse ano - pelo tema importante de visão limitada em nossa sociedade e pelas histórias que provocam a discussão de aspectos históricos, jurídicos e antropológicos.
Simplificando as coisas, o livro aborda a questão quilombola e as implicações que a cercam. Um dos motivadores da publicação, que descobri parte de uma série que quero continuar a conhecer, é o desconhecimento que há nos processos jurídicos sobre o tema. Os autores ressaltam que a sociedade é influenciada pela mídia de maneira sensacionalista e isso contribui para a estigmatização do tema. A questão acaba associada a conflitos que estimulam uma visão de rejeição e luta interesseira ao ser esvaziada de sua historicidade e real valor para as comunidades. O resultado é a morosidade na tramitação jurídica, que acaba favorecendo arbitrariedades e enfraquecendo as comunidades na concretização de seus direitos, mesmo que sejam amparadas juridicamente. Segundo o texto, as leis que defendem os interesses comunitários (de ribeirinhos, indígenas e quilombolas) nesse contexto tendem a ser manobradas por interesses políticos, do agronegócio, da mineração, das indústrias, do comércio, etc e tal, de carona com a expressão midiática pouco favorável às comunidades. Isso é muito verdadeiro nos dias atuais e, mesmo com conquistas jurídicas, o descumprimento, morosidade e arbitrariedade são ainda rotineiros, como nos oito casos ilustrados no livro.
Algo conclusivo que chamou muito minha atenção diz que nas condições descritas os conflitos serão sempre inevitáveis. Entendi que não é essencialmente uma questão de falta de legislação, mas do cumprimento delas, por todo o jogo de interesse implícito. Impressionante como em pleno século XXI gente morre e sofre como se estivéssemos em tempos de barbárie ou estado sem lei.
Os casos relatados revelam lutas diversas. Impressionam os casos e há a história resgatada de cada comunidade - o porquê e importância dessas lutas (algo que deveria ser conhecido no olhar da sociedade).
Legal e interessante. 
A única coisa que não gostei foi a desinformação no que distingue as duas partes em que o livro está organizado. Cada parte tem a apresentação de quatro estudos de caso e não soube diferenciar o que os organiza desse jeito, já que tudo me parece com o mesmo propósito. Numa literatura de rigor acadêmico esse aspecto foi pouco didático. Se foi explicado, passou em branco em minha leitura. Algo sem importância no contexto de representatividade da obra, mas que gostaria de ter entendido na caracterização metodológica do livro. Vale uma conferida. 
Conheçamos a história do Brasil no nível mais importante, o do valor de seus cidadãos e comunidades. Um passo importante para melhores tempos. 

Estudos de caso:

PRIMEIRA PARTE
- Quilombolas do rio Arari e Gurupá na mira de ações e ameaças de fazendeiro de Cachoeira do Arari 
- A criminalização de negros do norte de Minas: pretos “bandidos” e quilombolas “ladrões de terra e de gado”
- Dossiê dos conflitos e ameaças de morte contra quilombolas do Maranhão
- Conflitos Ambientais Territoriais no Norte de Minas: a resistência das comunidades vazanteiras frente a expropriação dos parques ambientais 

SEGUNDA PARTE
- Quilombolas da comunidade Três Irmãos: reações às perseguições do “coronelismo” no Ceará
- Judicialização do direito ao território: os quilombolas do Forte Príncipe da Beira, Costa Marques, Rondônia
- Situações de conflitos nos quilombos do Sapê do Norte: Direitos Humanos e criminalização
-  Territórios, identidades e direitos entre os Quilombos Urbanos de Belo Horizonte: o caso de Mangueiras

Eita! Esse livro tem bem mais para revelar do que minhas limitadas considerações. 
Ainda bem que está disponível para consultas na
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 

Macapá - Bairro Central

Coisa boa também é a coleção  NESSE LINK

segunda-feira, 30 de maio de 2016

À Sombra dos Castanhais (Laíses do Amparo Braga)

Romance paraense, que se mistura com o ambiente do Amapá, sobre a história de uma família de origem ribeirinha no início do século XX. Um retrato da vida nortista em suas expectativas, realidade rotineira, desilusões e realizações. 
A publicação é de 1991, de Laíses do Amparo Braga, tendo como característica mais marcante a história de luta de uma mulher. Ponto exaltado em outras de suas obras e que nesta, apesar da pretensão de protagonismo ao Manduca, não se faz diferente com o carisma de Emiliana, sua filha. Mulher decidida e idealista, que sobressai na cena de maneira mais interessante e cativante ao leitor.


Informações do livro:  
Título: À Sombra dos Castanhais  
Autora: Laíses do Amparo Braga
Editora: Falangola
Ano: 1991
Páginas: 165
Tema: Romance / Pará /Amapá

A obra tem três momentos em minha percepção. O primeiro faz um resgate da história de Manduca como ribeirinho na região do rio Cajari. Vemos a vida familiar interiorana com suas brevidades em construções (trabalho, casamento, descendência) e o cenário dos castanhais na realidade difícil e exploratória, como era comum na região do Jari. Algo que achei muito interessante foi a apresentação do cenário, que é introduzido de maneira idílica, embalando sonhos. A descrição é poética, principalmente nos dois primeiros capítulos, como um convite para conhecer a Amazônia. A partir daí os textos são pragmáticos no desenrolar do livro. A natureza se faz notar em sua mitologia também. Há a descrição da Lenda do rio Cajari e da região do Mazagão em episódios na tradicional Festa de São Tiago. Manduca é um jovem nesse meio com disposições, aprendizagens e oportunidades, sendo uma delas o casamento com a Zefa. 

O segundo momento está na vida familiar na Ilha do Pará, onde há o brotar de sonhos de seus cinco filhos (Deusalinda, Alvina, Emiliana, Dolores e Benvindo) pelos estudos e melhores condições de vida. A passagem é breve, mas significativa sobre a migração de muitos ribeirinhos, especialmente da região das ilhas interioranas, para as cidades. Há também um olhar sobre a cultura madeireira, que por muito tempo foi um dos principais sustentos nessas regiões. Iguais a esta família centenas na região migraram para Macapá, mas esse já será o terceiro momento no livro. Emiliana se faz notar e traz para si o protagonismo por seus sonhos e vontades incontidas. 

O terceiro momento, como já enunciado, é a vinda da família para Macapá, no recém-criado Território do Amapá, chamada de cidadezinha na obra e, ressalte-se, exatamente no período de criação territorial (1943). Havia expectativas grandes e oportunidades que se apresentavam especialmente por Macapá caminhar para se torna a capital - algo consumado no ano seguinte. A história se desenrola em uma passagem grande de tempo, cerca de quatro décadas, onde as personagens do pequeno núcleo familiar constroem suas vidas. As oportunidades chegam em diferentes contrastes, unindo mais ou separando-os. A transformação em Manduca é melancólica e reflete sobre escolhas pessoais.

É uma obra que tem pretensão de retrato de época, sem excentricidades, e é interessante por esse contexto de pseudorrealidade. Nada extraordinário, mas reconhecível em seus dramas. Essa foi uma releitura que fiz. A primeira foi em 1992 quando o romance foi indicado como literatura de consulta no Vestibular que prestei na UNIFAP. Eita! E lá se foram muitos anos à sombra dos castanhais...

É uma descrição limitada e pessoal da obra. 
Para sua consulta e avaliação, está disponível na
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia
 
Macapá - Bairro Central

segunda-feira, 9 de maio de 2016

As aventuras de Daniel Berg na selva amazônica (Marta Doreto de Andrade)

Biografia de Daniel Berg adaptada para a Literatura Infantojuvenil, sobre sua ação missionária na Amazônia, principalmente na região do Marajó, nas primeiras décadas do Século XX. A obra é também um resgate e valorização da história da Igreja Assembleia de Deus, da qual Daniel Berg foi um dos fundadores com Gunnar Vingren em 1911.
O missionário sueco percorreu os interiores da Amazônia levando sempre uma certa quantidade de Bíblias que, até então, eram um artigo de luxo para a maioria em seu manuseio e leitura. Dos eventuais encontros com crianças, a autora - Marta Doreto de Andrade - criou o cenário para o desenvolvimento do livro, onde Berg, instigado pela curiosidade infantil, conta um pouco de suas viagens e propósitos, direcionando sempre para o evangelismo.
Um livro muito interessante, com capítulos curtos e de fácil entendimento, ficando sempre (falo por minha leitura) um desejo de conhecer mais desses relatos, que impressionam e vivificam a fé.
Em referência aos aspectos que chamaram minha atenção, cito as histórias ocorridas em Quatipuru (com perseguições, livramento e perseverança), a mensagem pentecostal pregada (alvo de críticas e difamação da igreja desde o início), 
a conversão do dono de um bar, a cura de uma idosa à beira da morte e o livramento de feras.
O ponto alto mesmo, e sempre mais emocionante, refere-se à anunciação e aceitação do Evangelho. Algo tocante ao conhecermos a trajetória árdua, sofrida e com barreiras desestimulantes para essa realização. Uma história que deixou marcas na Amazônia e anunciou a mensagem de Cristo para milhares de vidas. Interessante para crianças, jovens e adultos.

Marta Doreto de Andrade é professora de crianças, comentarista de revistas de Escola Dominical na área infantil e autora de livros editados pela CPAD.

Daniel Berg (1884-1963) foi um missionário evangelista pentecostal sueco que atuou na Amazônia e Nordeste. Juntamente com Gunnar Vingren iniciou o movimento pentecostal brasileiro  que deu origem à Igreja Evangélica Assembleia de Deus, em Belém do Pará (1911). 

Informações do livro: 
Título: As aventuras de Daniel Berg na selva amazônica
Autora: Marta Doreto de Andrade
Editora: CPAD
Ano: 2009
Páginas: 184

ISBN: 978-85-263-0986-9
Tema: Biografia / Daniel Berg / Infantojuvenil / Amazônia

"Então, Jesus aproximou-se deles e disse: "Foi-me dada toda a autoridade nos céus e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu ordenei a vocês. E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos".
Mateus 28:18-20

terça-feira, 26 de abril de 2016

A Margem esquerda do Amazonas - Macapá (Amiraldo Bezerra)

O Amapá tem algo singular em sua produção literária, grande parte das obras estão na categoria de poesia ou contos. Sinto falta da prosa, de romances que sejam conhecidos regionalmente pela identidade marcante e reconhecível ao Estado. As iniciativas nesse campo são poucas e, invariavelmente, desconhecidas até mesmo da maior parte da população amapaense. Lamentável que se inclua nisso nossas escolas.  Ainda assim, encontramos algumas obras que tem sua relevância e aspectos interessantes para serem conhecidos. Quer comprovar? Vamos conhecer então mais uma delas. Simbora!


Ah, o livro da vez é A margem esquerda do Amazonas - Macapá, do Amiraldo Bezerra, publicado em 2008. Como será, hein? 
A obra é repleta de histórias e causos da antiga Macapá. Amiraldo construiu uma crônica de costumes de época, tornando-se a principal testemunha. Registrou a maneira pela qual as pessoas sentiam e se relacionavam, seus costumes no período de criação da cidade, comportamentos e tipos sociais, que com o tempo foram esquecidos. Escreve como se falava, mantém a gíria, o jeito de falar. Saudoso, às vezes critica, às vezes ironiza. Com o seu livro, Amiraldo não nos deixa morrer
Poxa! Bacana e instigante essa apresentação, mas não são palavras minhas. Dei uma colada básica do que o escritor Leão Zagury escreveu sobre ela. Foi o bastante para despertar minha busca.

Informações do livro: 
Título: A Margem esquerda do Amazonas - Macapá
Autor: Amiraldo Bezerra
Editora: Premius
Ano: 2008
Páginas: 272
ISBN: 978-85-7564-420-1
Tema: Amapá / Romance

Gosto de associar as leituras, quando possível, a um momento ou tema favorável e assim, por ocasião do aniversário de minha cidade fiquei entusiasmado para a leitura dessa obra. É um romance urbano narrado em primeira pessoa com ambientação em Macapá (está claro na capa, ô pateta!). É, mas não se trata dos tempos atuais, o romance nos remete aos anos sessenta (mora, bicho!), onde o autor misturou lembranças e experiências, embalado por certos aspectos reais, para contar a história de Rui e Virna.
Imaginamos sempre a cidade em um contexto de vilarejo e pouco desenvolvimento em seu início como capital, onde a maioria da população vive em condições muito humildes (o que historicamente está correto), mas o autor, destoando um pouco disso, optou por apresentar a história de jovens com famílias bem sucedidas e frequentadoras da alta sociedade. É o que vamos encontrar no romance, com o relato do cotidiano de uma vida burguesa que, em certos aspectos, foi a realidade de alguns. Há um detalhamento interessante em ambições e costumes dessa vida social para o leitor mais atento.
A personagem principal, Rui, tem dois momentos: a trajetória de sucesso de sua família (que teve início nesta cidade semelhante ao de muitos migrantes de ilhas paraenses - um retrato de época - mas com oportunidades de trabalho que foram bem sucedidas) e seu romance com Virna (trama com surpresas, reproduzindo o pensamento daquela juventude em busca de afirmação e quebra de tradições).
Interessante também que o autor, no início do livro, reúne uma série de causos e histórias da cidade que familiarizam o leitor àquela época. Boa introdução para o romance. Não sei qual o limite da ficção e realidade, mas são histórias ora curiosas, ora divertidíssimas. 

 
Caixa de Cebola, o primeiro ônibus de Macapá.
Fonte: porta-retrato-ap.blogspot.com

Ri muito com o causo do antológico e famigerado Caixa de Cebola, o primeiro ônibus de Macapá. Será verdade aquela patacoada que ocorria em relação aos sa... Ah, mas não vou te contar, mesmo! Lendas urbanas (ou será que não?) para uma boa leitura. 
A cidade e a sociedade de época se revelam em muitas coisas, em realidade e ficção. Tem aspectos curiosos que já ouvi falar, como uma madeireira na Ilha de Santana ou um bordel lá no final da rua Leopoldo Machado. Famoso em seu tempo.
 
E assim temos aí mais um belo livro. Um romance de agradável leitura, com pitadas de interessantes descobertas da morena cidade A MARGEM ESQUERDA DO AMAZONAS.


Aí vem os papos de sempre. Não custa lembrar...
A obra pode ser consultada no acervo da 
 Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia
 
Macapá - Bairro Central